Thursday, November 15, 2007

Realismo Politico e Guerra de Libertacao Nacional


Numa outra parte do seu artigo, de Pina deduze que “Cabral defendeu a pena de morte” e por conseguinte não poderia ter sido “afável e profundo” (como caracterizado por Corsino Tolentino, que eu partilho). Primeiro, afirmação de de Pina deixa o leitor sem saber como e porque é que houve os fuzilamentos (que, por acaso, não foram sumários) no pós-Congresso de Cassaca. Houve, de facto fuzilamentos, mas de líderes guerrilheiros que recusaram categoricamente a subordinação à direcção política do PAIGC. Em 1964 o PAIGC corria sérios perigos de desgate politico, por causa daquilo que Cabral designou de “militarismos,” isto é, líderes da guerrilha que utililzavam seu status, poder e violência contra populaçào em proveito próprio, minando, obviamente, a mobilização e o apoio das populações. O principio fundamental em causa aqui é o de o militar deve estar sempre subornado ao politico – curiosamente este principio e absolutamente aceitado por qualquer estado de direito. E quanto a sumariedade de fuzilamentos, parte do Congresso de Cassaca foi reservado a um tribunal, onde os acusados tiveram o direito de resposta (o princípio de audi alteram partem). E nem todos os acusados foram fuziladas, importa salientar (sobre este acontecimento, vide o livro Amílcar Cabral, de Patrick Chabal). Aqueles que resistiram o comando político, tentando sobrepor-se à força das armas, estes sim foram liquidados. O realismo político da guerra implica isso. Se o dito fuzilamento de aqueles que minavam a autoridade política não tivesse acontecido enviaria uma mensagem totalmente errada aos demais membros da guerrilha como também à própria população, o alicerce do esforço de guerra da libertação nacional. Isto porque a indisciplina, a insubordinação e o motim, deixadas por punir, provocam erosão psicológica e política a qualquer estrutura político-militar em tempo de guerra. A título de exemplo, não é por acaso que o Código Unficado de Justiça Militar das forças armadas americanas – ou de qualquer aparelho militar moderno – reserva a pena de morte como instrumento de manter a disciplina e a hieararquia.

Por outro lado, quem leu Cabral e a história dele e da libertacao nacional sabe que ele sempre acreditou na boa vontade e honestia da pessoa humana – o que, ironicamente, iria lhe custar a própria vida. Assim, a titulo de “informação gratis” foi o próprio Cabral que “reabilitou” Inocêncio Cani, depois deste ter sido afastado da direcção do PAIGC, em 1971, por crimes de corrupção, possibilitando assim, anos mais tarde, que tenha a oportunidade de o matar (vide, por exemplo, Quem Mandou Matar Amílcar Cabral? de José Pedro Castanheira, pp.118). Ao mesmo tempo, duvido que quem escreve que “devemos combater o oportunismo, a tolerância diante dos erros, as desculpas sem fundamento, […] e a mania de que um ou outro responsável é insubstituível no seu posto” (qualidades, importa salientar, que a grande parte da moderna classe política caboverdiana, tanto no governo como na oposição, simplesmente não observam) não possa ser qualificado de “afável e de profundo pensar.” Tanto mais que dos escritos de Cabral podemos sempre extrair licções que possam conduzir a vida política no presente. Assim sendo, é de ponderar no seguinte escrito de Cabral: “o poder vem do povo, da maioria, e ninguém deve ter medo de perder o poder. O dirigente deve ser o interprete fiel da vontade e das aspiraões da maioria (…)”

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