Thursday, November 15, 2007

Amilcar Cabral, Pluralismo Politico e Desenvolvimento Politico


O exercício da análise histórica implica, a troco de ser considerada inválida, um trabalho duro de investigacao no arquivo. A história faz-se na busca de factos históricos. Na impossibilidade de viver ou reviver o facto histórico, os dados históricos são como um prémio de consolo ao históriador. No entanto é da responsabilidade do historiador comunicar com e trazer à baila tais factos. E para tal, é preciso um sério trabalho de arquivo. Neste ponto, de Pina escreve – infelizmente, sem fazer uma consulta extensiva dos documentos emandos do PAIGC – que “não há, nos escritos de Cabral, uma única linha a favor do Estado de Direito…” Claro que este conceito, ainda que seja usado em todos os cantos no mundo de hoje, não fazia parte do vocabulário político corrente dos anos 60 e 70 – principalmente no quadro da dita África lusofona. Quem lê tal afirmação de de Pina fica com a impressão de que as ideas políticas de Cabral apareceram num só momento, e são caracterizadas por um certo dogmatismo (e logo são estáticas). Por outras palavras, fica-se com a impressão de que não houve mudancas ideológicas no pensamento de Cabral – ou do PAIGC. A conclusão lógica e bombástica: o PAIGC e o Cabral sempre defenderam o sistema de partido único. Nada que uma simples e fácil consulta aos arquivos do PAIGC não disacredita de Pina. Entendendo por “Estado de direito” como um regime que assenta no princípio da pluralidade política , no sustento de direitos fundamentais da pessoa humana, e, obviamente, a primazia do direito escrito sobre a vontade caprichosa dos governantes e burocratas, espera-se mostrar que tal foi a estratégia e o objectivo primário preconizado por Amílcar Cabral e outros membros da liderança política do PAIGC, nos primeiros anos da vida política clandestina. Datado 15 de Novembro de 1960 – o ano da “independência africana” – o “Memorandum do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde ao Governo Portugues,” fortemente influenciado pela descolonização británica e francesa, particularlmente no que refere ao principio “uma pessoa, um voto,” exigia do governo Portugues o seguinte (no seu ponto 4): “Liberdade de pensamento, liberdade política , liberdade de reunião, de associação, de formaçço de partidos políticos e de sindicatos, liberdade de imprensa, e garantias para o exercício efectivo dessas liberdades, sem descriminação de raça, de grau de cultura, de sexo, de idade e de condições de fortuna.” Facilmente pode-se constatar que houve uma altura liberalista no pensamento de Cabral, ao contrário do que muitos pensam.

É claro que tal projecto liberalista nunca foi levado à frente, por intransigência e teimosia do governo portugues, corrupto e caduco, liderado por um ultraconservador, que teimava em querer parar a história da libertacao nacional – claro que referrimos ao Salazar, personalidade que ainda este ano foi eleito como o mais famoso dos portugueses de todos os tempos, ainda que este tenha tramado a vida de muitos portugueses (vá la entender os lusitanos!). Ainda por estas alturas (finais dos anos cinquenta e princípios dos anos sessenta) acreditava-se que se poderia conseguir uma descolonização negociada, tal como os franceses e británicos tinham feito – depois, obviamente, de forte pressões nacionalistas dos africanos. Pelo contrário, o regime de Salazar reforcou o contigente armado nas colónias. Os acontencimentos em Angola de 4 de Fevereiro de 1961, levaram Salazar e os “ultracolonialistas” (Anderson) portugueses, em grandes desfiles típicos dos regimes fascistas, a declararem “Angola [e por conseguinte a África dita portuguesa] é nossa,” querendo com isso monstrar que meios não seriam observados na manutenção do status quo colonial. Perante tal situação, a luta armada foi a única solução, e resultou na independência das ilhas de Cabo Verde e de Guiné Bissau. É no quadro da luta armada que poderemos observar a mudança ideológica do Cabral e do PAIGC. O pluralismo político deixa, por razoes prácticas, de ser um princípio fundamental, e é substituido pelo principio da unidade (daí o slogan “unidade e luta”). Contra a tendência de divide et impera, estratégia generalizada do colonialismo na África, a unidade sob o PAIGC foi preconizada por Cabral – e isso explica as suas maquinações diplomáticas, muitas vezes sem sucesso, no sentido de atrair personalidades de outras formações políticas tais como o Leitão da Graca, o Pinto Bull, entre outros. A negação do pluralismo politico durante a luta da libertação nacional, como foi demonstrando, assenta no princípio da formação e manutenção de uma “frente unida” contra o colonialismo. Seria difícil travar uma guerra armada de libertação nacional se a força patriótica tivesse dividida em dois ou mais facções armadas. Tudo seria – incluindo o que na terminologia política actual designa-se de guerra de “warlords” – mas nunca uma guerra de libertação nacional . Aqui, o grande exemplo é o caso de Angola, onde o colonialismo português soube tirar proveito das discórdias entre as várias facções nacionalistas, nomeadamente entre a UNITA e o MPLA, na chamada “Operacao Madeira” dos inícios dos anos 70. E mesmo quando a teoria de centralismo democrático passour a ser um dos pilares da filosofia e praxis cabraliana, as preocupações de Cabral foram sempre de manter a ordem, a unidade e o respeito da pluralidade – ainda que dentro de uma estructura monolítica. Pode-se constar aqui um certo utopismo de Cabral, ao aceitar que fosse possivel manter pluralidade democrática dentro de uma estrucutura monolítica. Mas Cabral, como homem que foi, tambem “sonhou.” E sonhou que fosse possível “desenvolver o espírito de crítica” no seio de um partido único. Neste aspecto, ele sublinhou que “criticar é e deve ser o acto de exprimir uma opiniao franca, aberta, diante dos interessados, com base nos factos e com espirito de justica, para apreciar essa accao.” Até hoje não li uma definição da crítica política que seja tão forte e tão directo ao ponto do que esta proposta por Cabral. E tal definição é coisa de ser dita sempre e em voz alta. Talvez os nossos líderes aprendam com Cabral o que é criticar. E neste ponto que se deve desenvolver possíveis criticas ao pensamento de Cabral – um utopismo humanista, quando o homem político e mais um homini lupus.

Um outro grande utopismo que caracterizou Cabral foi a esperança que ele manteve de que se pode evitar a formação daquilo que Milovan Djillas, na sua análise do partido comunista jugoslavo nos anos 50, chamou de “nova classe.” Cabral expressou que era preciso “combater o espírito de grupos e de grupinhos, os círculos fechados, a mania do segredo entre algumas pessoas, as questões pessoais e a ambição do mando.” O que verificamos, infelizmente, é que o sistema de partido único, no periodo pós-colonial, implicou necessariamente aquele Robert Michael tinha designada de “lei de ferro da oligarquia,” isto é, a tendência da liderança política em converter numa oligarquia, preocupando apenas com a satisfação egoista dos seus interesses – e menos com os do povo. No entanto, nem mesmo a transição para o pluralismo poltico parece ter apagado esta tendência oligárquica. Formalmente designada uma democracia, uma grande parte da população caboverdiana não toma parte nenhuma no processo de tomada de decisões de políticas públicas. Pode-se falar de democracia sem participação no processo de tomada de decisõões que dizem respeito a toda comunidade política ? Só se entender a democracia no sentido elitista, tal como exposto por Joseph Schumpeter: competição dos membros da elite aos votos do povo.

1 comment:

Valdemar Monteiro said...

xiça primo!

nhu tem stado ta fazi trabadjo di casa..

sima n' flou, sta spera um análise num meio más formal (publicaçon/livro) e académico disso.