Wednesday, August 30, 2006

ANO DE MERDA DE 1973

Que ano de merda, o ano de 1973!
Ano fatal para Amilcar Cabral, que não pode ver a independência de Guiné e das ilhas de Cabo Verde concretizar-se (que iria, no entanto, nos anos seguintes). Com tal acontecimento, Cabo Verde, Guiné, a África e o mundo, perderam um dos seus melhores líderes políticos (ou, melhor, um verdadeiro “revolucionário par excellance” – Challiand).
Ano triste para o mundo esquerdista, o mundo daqueles que sonham, pois “não só do pão vive o homem.” Foi neste ano de merda, no dia 20 de Junho, que aconteceu o que ficou na história como Massacre de Ezeiza, em Argentina, quando snipers atiravam sobre Peronistas esquerdistas, provocando, pelo menos, 13 mortos mais de trezentos feridos.
Ano da Guerra de Yom Kippur, o quarto e o mais devastador conflicto Israelo-Árabe.
E para além de muitos outros trágicos acontecimentos, o ano de 1973 foi de facto UM ANO DE MERDA. Grande exemplo disso, é o poema de Vinicius de Moraes.
Para além de ter sido um poeta de amor, Vinicius foi também um poeta político. Soube sempre analizar em forma poética a vida politica (quando nacional, isto é, brasileira, sempre de forma camuflada, devido a censura do regime militar, instaurado no Brasil desde 1964). Por aqueles que seguem a politica latino-americano, sabem bem o que significa o ano de 1973: antes de 11 de Setembro ter sido confiscado pelos norte-americanos como um dia deles, foi sim o dia triste de Chile, da America Latina e do Mundo. 11 de Setembro 1973, Salvador Allende, presidente socialista eleito era deposto e morto quando defendia o palacio presidencial contra as forças anti-Allende, a comando do general Pinochet.O assassinato de Allende foi apenas uma “crónica de uma morte anunciada” (expressão de Gabriel Garcia Marquez). Não anunciadas, porém, não menos importante, foi a morte do Poeta do Canto General , Pablo Neruda (nascido Ricardo Eliecer Neftalí Reyes Basoalto).Dois Pablos morrerriam também neste ano “de puta que o pariu” (Moraes): o mestre de pintura, Picasso, em Abril e o virtuoso de Cello, Casals, em Outubro.Estes “Três Pablões, não três pablinhos” tinham algo em comum: o uso da arte como arma contra o fascismo de direita e a condição miserável das massas oprimidas.Abaixo, um dos melhores poemas do Mestre Vinicius de Moraes, que bem soube registrar sobre o ano triste de 1973...

1973
Breve consideração à margem do ano assassino de 1973

Que ano mais sem critério
esse de 73
Levou para o cemitério
três Pablos de uma só vez

Três Pablões, não três pablinhos
No tempo como no espaço
Pablos de muitos caminhos:
Neruda, Casals, Picasso.

Três Pablos que se empenharam
contra o fascismo espanhol
Três Pablos que muito amaram
Três Pablos cheios de Sol.

Um trio de imensos Pablos
em gênio e demonstração
Feita de engenho, trabalho
Pincel, arco e escrita à mão.

Três publicíssimos Pablos: Picasso, Casals, Neruda
Três Pablos de muita agenda
Três Pablos de muita ajuda.
Três líderes cuja morte
o mundo inteiro sentiu

Oh ano triste e sem sorte
Vá prá puta que o pariu!

Vinícius de Moraes
[Gravado ao vivo em São Paulo, 1974, com Toquinho e Quarteto em Cy]

1 comment:

Fábio Reynol said...

Abel, eu estava ha muito procurando esse poema de Vinicius e nao o encontrei nem nas obras completas dele publicadas no Brasil. Obrigado pela postagem. O convido a visitar o meu blog sobre o Brasil: www.diariodatribo.com.br
Um grande abraço a voce a Cabo Verde.